TEXTOS DE APOIO

A LEITURA DOS TEXTOS A SEGUIR IRÃO TE AJUDAR A APROFUNDAR AS TEMÁTICAS TRATADAS EM SALA DE AULA.


A) COLONIZAÇÃO DA AMÉRICA INGLESA:


TEXTO COMPLEMENTAR 1: AS TREZE COLÔNIAS DO NORTE E A IMPORTÂNCIA DE NÃO NASCER IMPORTANTE
(...) Esses dois sistemas opostos de colonização interior [ibérico e Anglo-saxão] mostram uma das diferenças mais importantes entre os modelos de desenvolvimento dos Estados Unidos e da América Latina. Por que o Norte é rico e o Sul é pobre? O rio Bravo assinala muito mais do que uma fronteira geográfica. O profundo desequilíbrio de nossos dias, que parece confirmar a profecia de Hegel sobre a inevitável guerra entre uma e outra América, nasceu da expansão imperialista dos Estados Unidos ou tem raízes mais antigas? Em verdade, já na matriz colonial o norte e o sul geraram sociedades nem um pouco parecidas e a serviço de fins distintos. Os peregrinos do Mayflower não atravessaram o mar para conquistar tesouros legendários nem para explorar a mão de obra indígena, escassa no Norte, mas para se estabelecer com suas famílias e reproduzir no Novo Mundo o sistema de vida e de trabalho que praticavam na Europa. Não eram soldados da fortuna, mas pioneiros; não vinham para conquistar e sim para colonizar: fundaram “colônias de povoamento”. É certo que o processo posterior desenvolveu, ao sul da baía de Delaware, uma economia de plantações escravistas semelhante à que surgiu na América Latina, mas com a diferença de que nos Estados Unidos o centro de gravidade esteve desde o princípio radicado nas granjas e nas oficinas da Nova Inglaterra, de onde sairiam os exércitos vencedores da Guerra de Secessão no século XIX. Os colonos da Nova Inglaterra, núcleo original da civilização norte-americana, não atuaram nunca como agentes coloniais da acumulação capitalista europeia; desde o princípio viveram a serviço de seu próprio desenvolvimento e do desenvolvimento de sua nova terra. As treze colônias do norte serviram de desembocadura para o exército de camponeses e artesãos europeus que o desenvolvimento metropolitano ia lançando fora do mercado de trabalho. Trabalhadores livres formaram a base daquela nova sociedade deste lado do mar.
Espanha e Portugal, em troca, contaram com uma grande abundância de mão de obra servil na América Latina. A escravidão dos indígenas foi sucedida pelo transplante em massa de escravos africanos. Ao longo dos séculos, houve sempre uma enorme legião de camponeses desempregados disponíveis para serem encaminhados aos centros de produção: as zonas florescentes sempre coexistiram com as decadentes, no ritmo dos apogeus e das quedas das exportações de metais preciosos ou açúcar, e as zonas de decadência abasteciam de mão de obra as zonas florescentes. Essa estrutura persiste até nossos dias, e também na atualidade implica um baixo nível dos salários, pela pressão que os desempregados exercem sobre o mercado de trabalho, e frustra o crescimento do mercado interno de consumo. De resto, distintamente dos puritanos do Norte, as classes dominantes da sociedade colonial latinoamericana não se voltaram jamais para o desenvolvimento econômico interno. Terrastenentes, mineradores e mercadores tinham nascido para cumprir outra função: abastecer a Europa de ouro, prata e alimentos. Os caminhos transportavam a carga numa só direção: até o porto e os mercados de ultramar. Esta é também a chave que explica a expansão dos Estados Unidos como unidade nacional e o fracionamento da América Latina: nossos centros de produção não estavam conectados entre si, formavam um leque com o vértice muito distante.
As treze colônias do norte tiveram, pode-se dizer, a felicidade da desgraça. Sua experiência histórica mostrou a tremenda importância de não nascer importante. Porque ao norte da América não havia ouro, nem prata, nem civilizações indígenas com densas concentrações de população já organizada para o trabalho, e nem solos tropicais de fertilidade fabulosa na franja costeira que os peregrinos ingleses colonizaram. A natureza se mostrou avara, e também a história: faltavam os metais e a mão de obra escrava para arrancar os metais do ventre da terra. Foi uma sorte. Além disso, desde Maryland até a Nova Escócia, passando pela Nova Inglaterra, as colônias do norte, devido ao clima e às
características dos solos, produziam exatamente o mesmo que a agricultura britânica, isto é, não ofereciam à metrópole, como adverte Bagú, uma produção complementar.
Muito diferente era a situação das Antilhas e das colônias ibéricas de terra firme. Das terras tropicais brotavam o açúcar, o tabaco, o algodão, o anil, a terebintina; uma pequena ilha do Caribe, do ponto de vista econômico, era mais importante para a Inglaterra do que as treze colônias matrizes dos Estados Unidos. Essas circunstâncias explicam a ascensão e a consolidação dos Estados Unidos como um sistema economicamente autônomo, que não drenava para fora a riqueza gerada em seu seio. Eram frouxos os laços que uniam as colônias à metrópole; em Barbados e na Jamaica, em troca, só se reinvestiam os capitais indispensáveis para repor escravos na medida em que iam faltando. Não foram fatores raciais, como se vê, os que decidiram o desenvolvimento de uns e o subdesenvolvimento de outros: as ilhas britânicas das Antilhas não tinham nenhum vínculo com a Espanha ou Portugal. A verdade é que a insignificância econômica das treze colônias permitiu a precoce diversificação de suas exportações e iluminou o impetuoso desenvolvimento das manufaturas. A industrialização norte-americana contou, desde antes da independência, com estímulos e proteções oficiais. A Inglaterra se mostrava tolerante, ao mesmo tempo em que proibia estritamente que suas ilhas antilhanas fabricassem até mesmo um alfinete. (GALEANO, E. As veias abertas da América Latina. Tradução de Galeno de Freitas. 39ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2000. p.127. Título original: Las venas abiertas de America Latina).

TEXTO COMPLEMENTAR 2: Experiências protestantes na colonização da América do Norte.
OS PURITANOS DE MASSACHUSETTS, OS QUAKERS DA PENSILVÂNIA E OUTROS GRUPOS
A colônia de Massachusetts recebera puritanos descontentes com a igreja inglesa. Sua disposição era contrária à tolerância religiosa que caracterizava outros grupos protestantes. Na colônia, esses puritanos de influência calvinista acreditavam numa igreja forte que tivesse poderes civis. Para a construção dessa igreja-Estado tomaram-se várias providências. Primeiro estabeleceu-se que somente os membros da igreja Puritana poderiam votar e ter cargos públicos. depois, tornou-se obrigatória a presença na igreja para as cerimônias, fato que não acontecia no resto das igrejas protestantes. Todos os novos credos deveriam ser aprovados pela igreja e pelo Estado. Por fim, estabeleceu-se que igreja e Estado atuariam juntos para punir as desobediências a essas e outras normas. Essa colônia aproximava-se, dessa forma, dos ideais católicos da teocracia.
Um dos fatos mais significativos derivado do ideal de igreja-Estado foi a perseguição às bruxas. O autoritarismo de uma religião que se pretendia única desencadearia, naturalmente, na perseguição de todas as formas de contestação – fossem reais ou imaginárias. As acusações de bruxaria, uma constante em todo o mundo cristão da época, existiam desde o início da colonização. No entanto, um surto de feitiçaria como o de salem, em 1692, assumia proporções inéditas. Nesse ano, um grupo de adolescentes acusou várias pessoas de enfeitiçá-las. O processo acabou envolvendo muitos membros da comunidade, entre homens e mulheres. A cidade de salem viveu uma histeria coletiva. Havia surtos freqüentes: moças rolavam gritando, caíam doentes sem causa aparente, não conseguiam acordar pela manhã, animais morriam, árvores cheias de frutos secavam. As razões, no entender dos habitantes de salem, só poderiam ter ligação com uma ação demoníaca.
Alguém era acusado de feitiçaria e comparecia diante do juiz. O juiz fazia o acusado e as vítimas (as moças aflitas, como eram usualmente chamadas) ficarem frente a frente. Era comum as moças terem novo ataque histérico diante do suposto feiticeiro. Os acusados eram enviados à prisão. A acusação caía sobre gente de todas as categorias sociais e sobre pessoas que gozavam da confiança da
comunidade há anos. O acusado era examinado. Havia uma crença generalizada de que a associação com o demônio produzia marcas no corpo: um tumor, uma mancha, regiões que não sangravam, polegar deformado. Submetidos a “tratamentos especiais”, muitos réus acabavam confessando que, de fato, estavam associados ao demônio e realizavam feitiços contra a comunidade. Imagem fantasiosa dos julgamentos de Salem. Enquanto a moça depõe, raios caem do céu.
A histeria das feiticeiras não seria possível sem as ardentes pregações de pastores como Cotton Mather (1663-1728). Esse pastor, nascido em Boston, escreveu o livro As maravilhas do mundo invisível, em que o leitor é levado a conhecer as grandes forças maléficas que agem sobre o mundo. Como no mundo católico, a crença num mal real e com ação efetiva era um dado social que unia desde o rei James I (autor de livro sobre feitiçaria) até o mais humilde camponês.
Os Processos de salem já receberam várias explicações. Algumas, de caráter mais psicológico, lembram as tensões entre mães e filhas, estas fazendo coisas que não poderiam normalmente fazer e alegando estarem enfeitiçadas. Em outras palavras, alegando o poder do demônio, uma jovem poderia gritar com sua mãe ou mesmo ficar nua! afinal, era tudo obra do demônio... A moral puritana de oração e trabalho era tão forte que os jovens não podiam, por exemplo, praticar esportes de inverno como patinar, pois isso era considerado imoral. Assim, diante dessa vida dura, a possessão passou a ser uma boa saída. Outras explicações remetem às tensões internas das colônias – entre as principais famílias – em que acusar o membro de uma família rival de bruxo ou bruxa tinha um grande peso político.
Conflitos entre indígenas e puritanos, como a chamada Guerra do rei Filipe (nome que os colonos deram a um líder indígena em 1675-76), tinham deixado a Nova inglaterra em tensão permanente. Muitos colonos haviam sido mortos ou capturados. As tensões entre vizinhos vinham se acumulando. Tudo isso colabora para explicar o ambiente que gerou o surto de salem.
Por fim, sem esgotar as explicações, há de se levar em conta todas as frustrações dos protestantes no Novo Mundo, onde o sonho de uma comunidade perfeitamente construída de acordo com as leis de deus e da Bíblia não havia se realizado. Os pastores puritanos viram no aparente surto de feitiçaria uma maneira de recuperar o controle e o entusiasmo do grupo. Os habitantes de Massachusetts haviam se dado conta de que não apenas a Bíblia e as boas intenções haviam atravessado o oceano, mas todas as suas mesquinharias, maledicências e tensões. Melhor seria, assim, atribuir esses problemas ao demônio e a seus seguidores.
Ao final da crise, quase 200 pessoas tinham sido presas e 14 mulheres e 6 homens executados. A teocracia puritana tinha deixado um saldo trágico na memória dos colonos. Quase 100 anos depois, a primeira emenda à Constituição dos EUA estabelecia que o Congresso não faria leis sobre o livre exercício da religião.
Além dos puritanos, as colônias receberam outros grupos religiosos como os quakers (ou sociedades de amigos), o grupo mais liberal que surgiu com a reforma. Tratar-se por “tu”, sem nenhum título, sendo cada homem sacerdote de si mesmo, eis um dos princípios dos quakers que valeu até a admiração do pensador Voltaire no Dicionário filosófico. Ao iniciar sua pregação no Novo Mundo, os quakers encontraram grande oposição dos líderes puritanos. Alguns foram até mortos como subversivos, ao mesmo tempo em que suas idéias encontravam eco entre os desencantados com a rígida disciplina puritana. A experiência quaker no Novo Mundo foi solidificada quando William Penn estabeleceu uma grande colônia para abrigá-los: a Pensilvânia. a Pensilvânia não era apenas um local para refúgio dos quakers, mas também de todas as religiões que desejassem viver em liberdade e paz. O próprio Penn referia-se a esse fato como “a santa experiência”. Nascido em Londres, em 1644, Penn era filho de um almirante conquistador da Jamaica. Em Oxford, converteu-se aos quakers após ouvir um animado sermão de thomas Loe. Há nas idéias de Penn e dos quakers princípios anarquistas. Penn gostava de dizer: “No cross, no crown” (nem cruz, nem coroa).
Perseguido por suas idéias na inglaterra, ele desejou estabelecer uma comunidade-modelo na américa, obtendo então uma vasta extensão de terra a oeste do rio Delaware. Oferecendo terras gratuitas e a garantia de liberdade religiosa, Penn atraiu grande quantidade de colonos da Europa e das outras colônias inglesas. Gente de todas as partes da Europa viu nas propostas do líder uma nova oportunidade. Dentre eles, por exemplo, alemães e holandeses do grupo menonita rumaram para a américa. (sua marca até hoje é uma vida no campo, sem eletricidade ou outros símbolos do mundo industrial.) Descrevendo os quakers, em 1696, o próprio Penn afirmava que deus ilumina cada homem sobre sua missão. Por isso, os quakers insistem em expressões do tipo: “luz de Cristo dentro de cada homem” e “luz interior”. Com esses princípios, Penn defendia a grande liberdade religiosa, tendo em conta que deus pode falar de maneiras variadas a cada homem.
No início do século XVIII, Filadélfia, capital da Pensilvânia, era uma das maiores cidades das colônias inglesas e também uma das mais alfabetizadas. Um viajante a descreve em 1748: “Todas as ruas, exceto as que estão mais próximas do rio, correm em linha reta e formam ângulos retos nos cruzamentos. A maior parte das ruas está pavimentada... As casas têm boa aparência, freqüentemente são de vários pisos... A cada ano se montam duas grandes feiras, uma em 16 de maio, outra em 16 de novembro. Além destas feiras, a cada semana há dois dias de mercado, às quartas e sábados. Nesses dias, gente do campo da Pensilvânia e Nova Jersey traz à cidade grande quantidade de alimentos e outros produtos do campo”.
A experiência de Penn funcionou de fato enquanto seu fundador esteve à frente dela. Os problemas da Pensilvânia longe do governo pessoal do fundador revelaram-se grandes. Choques entre os grupos religiosos, tentativa de diminuir a liberdade religiosa e outras tantas desavenças ocorreram, perturbando o ideal primitivo. No entanto, mesmo que, ao longo do século XVIII, a Pensilvânia em pouco se diferenciasse das outras colônias, permaneceu sendo um dos locais de maior tolerância religiosa do mundo.
No século XVIII, um fenômeno chamado “Grande despertar” (Great Awakening) marcou a vida religiosa das colônias. Uma das características do movimento foi o surgimento de pregadores itinerantes. Os ministros religiosos iam de povoado em povoado pregando uma religião mais emotiva e carismática. Sermões exaltados, conversões milagrosas, entusiasmo e cantos: as pregações desses pastores atraíam os grupos cansados do formalismo da religião oficial. O “Grande despertar” foi descrito, em 1743, pelo pesquisador norteamericano J. Edwards: “Ultimamente, em alguns aspectos, as pessoas em geral têm mudado e melhorado muito em suas noções de religião; parecem mais sensíveis ao perigo de apoiar-se em antigas experiências [...] e estão mais plenamente convencidas da necessidade de esquecer o que está atrás e avançar, mantendo avidamente o trabalho, a vigilância e a oração enquanto vivam”.
Ao valorizar a experiência pessoal da religião, o “Grande despertar” estimulou o surgimento de inúmeras seitas protestantes. Mais importante ainda, esse movimento procurou negar a tradição religiosa. Como vimos no documento transcrito, as pessoas devem evitar o apoio de antigas experiências e esquecer o passado. Isso colabora ainda mais para o particularismo religioso das colônias. Também existia uma importante comunidade católica em Mary land. Apesar de quase 1/3 dos cidadãos norte-americanos serem católicos hoje e terem fornecido um presidente ao país no século xx (Kennedy ), no período colonial havia grande desconfiança contra os chamados “papistas”. Os católicos
romanos foram vistos como avessos à democracia no período das Guerras de independência e fiéis seguidores de uma autoridade estrangeira (o papa), sendo, por isso, considerados potencialmente perigosos à nova nação. (KARNAL, Leandro (Org.). História dos Estados Unidos: das origens ao século XXI. São Paulo: Contexto, 2007. p.59-64)

Comentários